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Caso Richthofen: mansão vendida segue vazia e borrada no Google

Após 20 anos de um dos assassinatos mais emblemáticos do Brasil, a mansão do caso Richthofen, na Zona Sul de São Paulo, vendida por R$ 1,6 milhão após o crime, segue desocupada, sem nenhum morador, disseram vizinhos.

“Também [sou] curioso em saber do rumor da casa da [família] Richthofen, o pessoal tem falado bastante que às vezes tem um entra e sai, mas ninguém realmente mora aqui”, disse o profissional de marketing Lorenzo Gumieri, de 19 anos, morador da região. “Bastante curioso esse caso, e a gente quer saber o que está acontecendo por aí [dentro do imóvel].”

Em 31 de outubro de 2002, o casal Marísia e Manfred von Richthofen foi morto com golpes de barras de ferro na cabeça enquanto dormia no casarão de muros altos, de 1 mil m², na Rua Zacarias de Gois, no Campo Belo. A filha das vítimas, Suzane von Richthofen, além do namorado e o cunhado dela, os irmãos Daniel e Cristian Cravinhos, confessaram o homicídio e foram presos pela polícia.

Segundo o Ministério Público (MP), os três alegaram que os pais de Suzane não aprovavam o namoro dela com Daniel. Então, decidiram matá-los para poder ficar com o imóvel, o dinheiro e outros bens da herança da família.

Condenados a mais de 30 anos de prisão pelos homicídios na Justiça em 2006, as penas deles deverão ser extintas entre 2038 e 2043.

Dos três, Suzane cumpre a punição no semiaberto na penitenciária de Tremembé, no interior do estado. Cristian também está no mesmo regime e na mesma cidade. Já Daniel está em liberdade.

Mansão Richthofen

A mansão dos Richthofen havia sido comprada em 1998 por Manfred. Ele pagou à época R$ 330 mil pelo imóvel. A residência tem dois pavimentos com sala, cozinha, banheiros, suítes, escritório, biblioteca, piscina e garagem.

Em 2014, Suzane abriu mão da herança após uma disputa judicial com o irmão Andreas. No mesmo ano, ele vendeu o casarão por metade do valor de mercado. Os atuais donos, um engenheiro e uma dentista, não quiseram falar com a reportagem sobre o assunto.

Quando os novos proprietários compraram a mansão, decidiram reformar o espaço. A fachada da residência e tijolos à vista da época do crime, mostrada nas TVs e nos jornais, foi trocada. Acabou pintada de branco. A tinta cobriu também o número da casa, além das pichações que antes pediam “justiça” aos assassinos dos Richthofen.

Além de Lorenzo, que mora no bairro há quatro meses, a reportagem conversou nos últimos dias com mais três pessoas que disseram que ninguém nunca residiu no imóvel depois do crime: uma vizinha que está no bairro há décadas; um jardineiro que trabalha nos casarões próximos há nove anos e um segurança que percorre o bairro há três anos. Eles pediram, no entanto, para não serem identificadas.

Segundo eles, o atual dono da mansão e um jardineiro visitam o imóvel eventualmente, mas não moram nele.

Já no Google Maps a casa não pode ser vista . O site de buscas na internet oculta a imagem do casarão para quem quiser ver a foto a partir do endereço. No lugar onde deveria aparecer a mansão tem um retângulo que desfoca a residência para não mostrá-la.

O Google informou, por meio de sua assessoria de imprensa no Brasil, que não comenta casos específicos. E que, por isso, não poderia responder qual foi o motivo que levou o site a borrar a foto da mansão. A empresa também não explicou se a decisão de desfocar o imóvel foi dela ou dos proprietários.

“Não comentamos casos específicos. O Google toma uma série de medidas para proteger a privacidade das pessoas em relação às imagens do Street View e desenvolvemos uma tecnologia de ponta para desfocar, automaticamente, rostos e placas de veículos”, informa trecho da nota da empresa. “Se o usuário notar que seu rosto ou a placa do seu veículo precisa de um desfoque mais acentuado ou que desfoquemos a imagem, casa ou carro por completo, é possível reportar por meio dos nossos canais de denúncia.”

Mesmo assim, o local continua sendo ponto de visitação de curiosos que querem saber onde ocorreu um dos crimes mais comentados no país.

Foi dentro da mansão que Marísia e Manfred von Richthofen foram mortos com golpes de barras de ferro enquanto dormiam, em 31 de outubro de 2002. Ela era psiquiatra e tinha 50 anos. Ele, alemão naturalizado brasileiro, tinha 49 anos e era engenheiro.

O promotor Paulo José de Palma, que acompanha os processos dos condenados, informou que não poderia falar sobre o assunto porque ele está em segredo de Justiça.

Segundo a acusação do Ministério Público à época, os irmãos Daniel e Cristian Cravinhos entraram na residência e mataram o casal a pedido de Suzane von Richthofen, filha das vítimas.

Suzane tinha 18 anos e iria completar 19 três dias depois do crime. Além de estudar direito, ela namorava Daniel. O rapaz, então com 21, praticava aeromodelismo. Cristian, que estava com 26 anos, não estudava e era apaixonado por motos.

Andreas von Richthofen, filho caçula do casal e irmão de Suzane, tinha 15 anos. Ele não participou do crime nem sabia do plano da irmã e dos Cravinhos de matar seus pais. O adolescente havia sido levado de carro por Daniel e Suzane a um cibercafé.

Depois o trio voltou à mansão. Suzane permitiu que os irmãos entrassem e assassinassem Marísia e Manfred. Enquanto ela ficou na sala, eles subiram ao quarto do casal, com os rostos cobertos com meia-calças e usando luvas cirúrgicas.

“Hoje eu vejo como era feliz e não sabia. Como eu queria a minha família de volta”, disse Suzane em entrevista ao Fantástico em 2005.

Daniel assassinou Manfred com golpes de barra na cabeça. Depois colocou um saco plástico na cabeça dele. E Cristian matou Marísia com pancadas de ferro no crânio. As vítimas não resistiram aos ferimentos e faleceram no local.

Os Cravinhos ainda roubaram R$ 8 mil e US$ 5 mil em dinheiro e joias. Pegaram um revólver que estava na casa e deixaram ao lado do corpo de Manfred para simular que ele tentou se defender de um roubo, mas que teria sido foi morto por um suposto assaltante.

“Depois do que tinha acontecido, parece que acordei, para mim parecia que poderia voltar no tempo. Eu quis acordar ele [sogro], eu fazia carinho nele, eu queria acreditar que nada daquilo tinha acontecido [assassinato]”, contou Daniel à Justiça na época.

Suzane e Daniel foram a um motel após o crime. Cristian pegou o dinheiro roubado e pediu a um amigo para comprar uma moto nova para ele dez horas após cometer o assassinato.

Pela manhã, Suzane buscou o irmão e chamou a Polícia Militar (PM) alegando que as portas da mansão estavam abertas. Os policiais entraram e encontraram o casal morto sobre a cama.

A Polícia Civil começou a investigar o crime como latrocínio, que é o roubo seguido de morte. Mas o circuito interno de TV e o alarme da casa estavam desligados, e não havia sinais de arrombamento no imóvel.

O caso repercutiu na imprensa. A TV gravou Suzane e Daniel chorando ao lado de Andreas no cemitério enquanto os caixões com os corpos dos pais eram enterrados.

Em 3 de novembro de 2002, ela completou 19 anos. E, no dia 7 daquele mês, a investigação viu a motocicleta nova na garagem da casa onde Cristian morava com o irmão e a família. Ele foi levado à delegacia, onde acabou interrogado e confessou como cometeram o homicídio. Suzane e o então namorado também foram ouvidos e admitiram ter participado do crime.

O motivo do crime seria, segundo os depoimentos dados à polícia, o fato de Marísia e Manfred não aprovarem o relacionamento de Suzane com Daniel, já que ela era de uma família rica, e ele não. Para a investigação, no entanto, o trio também queria ficar com parte da herança que Suzane receberia no caso da morte dos pais.

Os três foram presos preventivamente por decisão da Justiça. Depois disso, a mansão teve os muros pichados com frases e palavras pedindo “Justiça” e punição a Suzane, Daniel e Cristian.

Em 2006, os três acabaram condenados num julgamento popular. A maioria dos jurados entendeu que eles deveriam ser responsabilizados pelos crimes de duplo homicídio triplamente qualificado, por motivo torpe, meio cruel e impossibilidade de defesa das vítimas, além de fraude processual, porque alteraram a cena do crime. Cristian ainda foi condenado por furto.

No júri, Suzane alegou que era agredida pelo pai e estava apaixonada por Daniel. E que foi manipulada pelo namorado a participar do crime. Ela disse ainda que Daniel e o irmão dele queriam o dinheiro dos pais dela. O então namorado contou que foi seduzido por Suzane, que planejou os assassinatos dos pais.

Quando foi julgado, Cristian chegou a dar duas versões para o crime. Na primeira, alegou que não participou, e que seu irmão Daniel havia matado Marísia e Mandred sozinho. Depois pediu para dar um novo interrogatório, no qual admitiu ter assassinado a mulher.

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