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Mundo sofre com a inflação, ela veio para ficar.

A cena é cada vez mais comum nos supermercados: o cliente compara preços, troca marcas, substitui produtos. A carne dá lugar ao frango, que é trocado pelo ovo. Uma das estratégias é parar de fazer compras em um supermercado de rede, com preços mais altos, e passar a frequentar estabelecimentos menores, em busca de promoções. Nos postos de combustível, o susto para abastecer o carro também é frequente.

Essa é a rotina do brasileiro em tempos de inflação elevada. Mas o fenômeno não se restringe ao Brasil. Em países ricos, como Estados Unidos, França e Alemanha, as famílias passaram a encarar as mesmas dificuldades.

Economistas afirmam que, em meio à alta dos juros, a inflação nos países ricos deve ceder nos próximos anos. Mas a tendência é de que ela se estabilize em patamares mais elevados, acima de 2%, porque o mundo mudou. A inflação perto de zero ficou no passado.

Com moeda forte e economia equilibrada, a França registrou entre 2010 e 2019 inflação anual média de 0,96%. O cenário mudou. No intervalo de um ano, o índice se multiplicou quase quatro vezes: saiu de 1,4% no acumulado de 12 meses até maio de 2021 para 5,2% até maio de 2022. Pode ser pouco, já que a inflação no no Brasil está atualmente perto dos 12%, mas a alta de preços é um problema social em qualquer lugar do mundo.

Além da França, países ricos como EUA, Alemanha e Reino Unido passaram os últimos anos se preocupando pouco com a alta de preços. Para o economista Emerson Marçal, coordenador do curso de economia da FGV/EESP (Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), esses países ficaram em situação “confortável” por 15 anos. “Foi um período de exceção, em que os juros estavam baixos e a inflação ainda não respondia”, afirma. “Assim, os países se sentiram à vontade para dar mais estímulos”. A pandemia mexeu com o cenário. A crise sanitária prejudicou o transporte de mercadorias ao redor do mundo e o fornecimento de insumos para a indústria. Depois vieram a demanda maior por alimentos, a disparada dos combustíveis, a guerra entre Rússia e Ucrânia. Para fazer frente à crise, os países ricos e emergentes distribuíram dinheiro para a população. Nos EUA, os cheques chegavam pelo correio. No Brasil, o governo utilizou o aplicativo Caixa Tem, da Caixa Econômica Federal, para pagar o Auxílio Emergencial. As taxas de juros também seguiram baixas por muito tempo, para estimular os negócios. A situação hoje reflete uma combinação explosiva para os preços: dificuldades na oferta, com procura maior por produtos.

Nos 12 meses até maio deste ano, a gasolina ficou 28,7% mais cara no Brasil, conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Na França, o salto também foi considerável, de 24,2%, segundo o Insee (Instituto Nacional da Estatística e dos Estudos Econômicos, na sigla em francês). Nos EUA, o preço da gasolina subiu 48,7%, de acordo com o Departamento do Trabalho.

A alta de preços se espalhou pelos países, incluindo aqueles pouco acostumados com a inflação. Na Alemanha, a inflação acumulada em 12 meses se multiplicou três vezes em um ano: de 2,5% em maio de 2021 para 7,9% em maio de 2022. Nos EUA, o percentual saltou de 5% para 8,6% no período. Todas as maiores economias do mundo estão com índices acima dos 2%.

Conhecendo’ a inflação

A alta de preços não é novidade no Brasil, país acostumado aos surtos inflacionários. Desde que o Plano Real foi lançado, em julho de 1994, houve quatro momentos em que a inflação de 12 meses ficou acima de 10%. No mesmo período, Reino Unido, França, Alemanha e EUA não viram inflação de dois dígitos. Recentemente, a situação mudou. No Reino Unido, a inflação em 12 meses passou de 2,1% em maio de 2021 para 7,9% em maio de 2022. “Os ingleses não sabem o que fazer, como deixar de consumir”, diz o brasileiro Adam de Vecchi, diretor de escola em Londres. Morando no Reino Unido desde 1997, ele afirma que os ingleses, diferentemente dos brasileiros, não estão acostumados com a inflação.

Segundo Mailson, o economista, os países ricos levarão dois ou três anos para atingir uma inflação próxima de 2%, porque a pandemia e a guerra na Ucrânia mudaram o cenário. A pandemia forçou uma espécie de “desglobalização”, diz Mailson. “Durante a pandemia, a escassez de componentes paralisou fábricas no mundo inteiro. Não havia chip para fabricar automóveis”, exemplifica. “Agora, a tendência é de que os fornecedores de componentes estejam mais próximos de cada país. E isso significa que o custo pode ser maior.”

Para segurar a inflação, muitos países estão elevando os juros ou sinalizando que podem fazer isso nos próximos meses. Com juros mais altos, em tese, o consumo cai e os preços cedem. Nos EUA, o Fed (Federal Reserve, o banco central americano) elevou os juros em 0,75 ponto porcentual em julho, para a faixa entre 2,25% e 2,50% ao ano. Também em julho, o BCE (Banco Central Europeu) subiu os juros de -0,5% para 0%. Foi o primeiro aumento em 11 anos. A dúvida é se a alta de juros conduzirá a inflação dos países ricos a patamares próximos de zero, como verificado nas últimas décadas. Economistas acreditam que a inflação vai ceder na Europa e nos EUA, mas não ficará tão baixa.

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